Césio-137: o pior acidente radiológico da história aconteceu em Goiânia

O acidente radiológico com césio-137 ocorrido em Goiânia, em setembro de 1987, foi o pior envolvendo fontes radioativas de toda a história, de acordo com a Agência Internacional de Energia Atômica (IAEA). Devido à exposição ao material radioativo, que estava dentro de um equipamento de radioterapia, cerca de 6.500 pessoas foram contaminadas, das quais quatro morreram.

Hoje felizmente a situação está controlada. Todo o material contaminado encontra-se devidamente isolado e monitorado pela Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN).

A narrativa de uma tragédia

No dia 13 de setembro de 1987, dois catadores de sucata invadiram o antigo prédio do Instituto Goiano de Radioterapia, desativado há mais de dois anos, e encontraram uma máquina. Não sabiam que se tratava de um equipamento de radioterapia, muito menos o enorme perigo que corriam. O aparelho foi dividido a golpes de marreta. E a fonte de césio foi rompida.

Logo vieram os sintomas da contaminação: enjoos, tonturas, vômitos, diarreias. Um deles ficou com a mão inchada e foi ao hospital por causa de estranhas queimaduras nas mãos e nos braços. Seis dias depois, venderam parte da máquina para um ferro-velho.

O dono do ferro-velho ficou impressionado com o conteúdo de uma cápsula metálica: um pó branco que, à noite, emitia um brilho azul. Deixou essa cápsula na sala de casa e chamou parentes e amigos, a quem distribuiu porções daquela substância.

Ficaram todos doentes. Alguns foram internados. Os sintomas eram os mesmos dos catadores que encontraram o equipamento.

Fragmentos do aparelho de radioterapia chegaram a ser revendidos para outros dois ferros-velhos da cidade. Com isso, a cadeia de contaminação só aumentava.

Só no dia 28 de setembro, a esposa do dono do ferro-velho e um dos empregados pegaram um ônibus e entregaram a cápsula à Vigilância Sanitária de Goiânia.

Um dia depois, dois físicos realizaram testes e confirmaram as suspeitas dos médicos: o material era altamente radioativo. Tinham que agir rápido para evitar uma tragédia ainda maior.

O local onde a fonte de césio-137 foi rompida, no centro de Goiânia, hoje é um terreno abandonado.

Mas por que o acidente radiológico de Goiânia foi o pior de todos os tempos?

O acidente de nuclear de Chernobyl é considerado pela IAEA o mais grave da história. Mas, afinal, o que foi pior: Goiânia ou Chernobyl?

Apesar de ambos serem acidentes radioativos, é preciso fazer uma distinção entre acidentes nucleares e radiológicos. Os nucleares ocorrem em instalações industriais destinadas à produção de energia – o que aconteceu em Chernobyl, por exemplo, foi uma explosão seguida de incêndio em um dos reatores da usina que espalhou enorme quantidade de material radioativo (incluindo o césio) na atmosfera.

Já o acidente de Goiânia foi provocado pela violação indevida de uma fonte radioativa, o césio-137, que estava dentro de um equipamento de teleterapia, usado no tratamento do câncer.

Portanto, trata-se de desastres radioativos diferentes. Chernobyl foi o pior acidente ocorrido em instalações nucleares. Goiânia, o pior acidente envolvendo fonte radioativa.

Chernobyl, sem dúvida alguma, teve consequências mais devastadoras: 31 pessoas morreram nos três primeiros meses, a cidade de Pripyat, na Ucrânia, teve de ser completamente evacuada e até hoje há uma zona de exclusão cujo acesso é controlado pelas autoridades locais.

Veja também: Chernobyl: saiba quem mora hoje e como é a vida no local

O que chama a atenção no acidente de Goiânia, e o que fez dele o mais grave desse gênero, foi o tempo decorrido entre a violação da fonte de césio e a notificação às autoridades: 16 dias. O cloreto de césio se espalha facilmente através do contato. Assim, à medida que a substância ia sendo manuseada e distribuída, surgiam novos focos de contaminação. Só para se ter uma ideia, basta encostar o dedo no cloreto de césio e depois pegar um objeto qualquer para este objeto já estar contaminado.

No dia 23 de outubro de 1987, faleceram as duas primeiras pessoas: a esposa do dono do ferro-velho e sua sobrinha de seis anos que havia ingerido comida contaminada. Dois funcionários do ferro-velho morreram pouco tempo depois.

O que foi feito para conter a contaminação?

Acionou-se imediatamente um plano de emergência para conter a contaminação. Áreas da cidade, incluindo casas, foram isoladas. 112.800 pessoas, ao todo, foram monitoradas, entre as quais 6.500 foram classificadas como vítimas, por apresentarem níveis de radiação acima do normal. Essas pessoas passaram por procedimentos médicos de descontaminação e algumas chegaram a ser isoladas, devido aos riscos de transmissão.

Cinco pessoas (quatro médicos e um físico) foram responsabilizadas criminalmente pelo abandono da máquina de teleterapia dentro da clínica e cumprirem pena em regime semiaberto. Mais tarde, conseguiram substituir a pena por trabalho comunitário.

Todo o processo de descontaminação da cidade gerou mais de 6.000 toneladas de lixo radioativo, que foi armazenado em contêineres de aço e levado a dois depósitos subterrâneos na cidade de Abadia, a 25 km de Goiânia. Hoje, esses depósitos são monitorados pelo CNEM e vigiados pela polícia. E isso deve durar pelo menos mais 300 anos, que é o tempo estimado para que toda a radioatividade dos rejeitos tenha se esgotado. Como a radioatividade de um material só diminui naturalmente, não há nada que se possa fazer a não ser esperar.

Segundo informações do CNEM, o acidente de Goiânia hoje não traz riscos ao meio ambiente. Os níveis de radiação, tanto nos locais afetados, quanto no entorno dos depósitos de Abadia, encontram-se dentro de limites aceitáveis.

Como estão os sobreviventes hoje?

Muitas pessoas ainda convivem com sequelas físicas e psicológicas. Hoje existe o Centro de Assistência aos Radioacidentados (CARA), que presta apoio médico e psicológico às milhares de vítimas. Muitas delas sofrem problemas de saúde decorrentes da radiação, como o desenvolvimento de tumores e hipertensão.

A radiação de tipo ionizante, como a do césio-137, pode danificar as células do copo humano. Em casos de radiação elevada, isso pode levar à morte de células, provocando sérias complicações, como hemorragias e anemias.

Saiba mais: Como o acidente nuclear de Fukushima nos afeta hoje.

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