Quem foi Calígula, o imperador romano que pensava que era deus


Caio Júlio César Augusto Germânico (12 d.C.-41 d.C.), apelidado de Calígula, governou o império mais poderoso do mundo entre os anos 37 e 41 d.C. Foram apenas 1.400 dias como imperador. O suficiente para transformá-lo num dos mais famosos imperadores romanos, até hoje lembrado por seus excessos, crueldades e extravagâncias, entre as quais a de se autoproclamar deus, com direito a templo e estátua em sua homenagem.

Como Calígula se tornou imperador

Calígula foi o 3º imperador imperador de Roma, o posto mais alto que algum ser humano poderia alcançar em sua época. Mas para chegar lá, passou por poucas e boas.

Calígula
Escultura de Calígula no Carlsberg Glyptotek, museu de arte em Copenhagen, na Dinamarca.

De onde vem o nome Calígula?

O pai de Calígula era filho de Germânico, um dos mais importantes generais do Império. Quando criança, Calígula acompanhava o pai nas campanhas militares vestido com roupas militares. Acabou caindo nas graças dos soldados, que o apelidaram de Calígula ("pequenas botas"), em referência às sandálias militares chamadas cáligas.

cáliga
O nome Calígia é uma referência às cáligas romanas.

Ele era bisneto do fundador do Império

A mãe de Calígula, Agripina, era neta de Augusto (63 a.C.-14 d.C.), fundador do Império Romano. Calígula, portanto, além de ser filho de um importante general, era bisneto do primeiro imperador. Pensando no futuro, a mãe o criou para ser grande. E parece que o filho entendeu direitinho o recado.

O sofrimento de Calígula

Tibério (42 a.C.-37 d.C.) era o imperador de Roma nessa época. Sentindo-se ameaçado pela alta popularidade do pai de Calígula, ele mandou envenená-lo. Depois, perseguiu toda a família de Calígula. Resultado: sua mãe morreu e um de seus irmãos morreram no exílio. O outro suicidou-se. Só Calígula e as irmãs foram poupados.

Calígula é prisioneiro do algoz de sua família

Calígula e suas irmãs são vigiados de perto pela guarda pretoriana. Com 17 anos, ele é obrigado a ir morar com o tio-avô Tibério, o algoz de sua família, em seu palácio na ilha de Capri. Lá Calígula é mantido prisioneiro por 6 anos e consegue se aproximar de Tibério, que o prepara para ser seu sucessor.

Morte de Tibério e ascensão de Calígula

Aos 77 anos, Tibério adoece e morre. Há rumores de que Calígula tenha "completado o serviço" sob vistas grossas de Macro, capitão da guarda imperial. Seja como for, o fato é que Calígula, aos 24 anos, sente-se pronto para se tornar imperador. E é com esse objetivo que ele vai a Roma reivindicar o trono ao Senado.

O Império de Calígula

Calígula
Busto do imperador Calígula na Real Casa del Labrador, na cidade espanhola de Aranjuez.

Logo de cara, Calígula agrada a todos, incluindo o povo. Ajudou nessa boa impressão o fato de Calígula querer se opor ao seu antecessor, Tibério, que tinha baixa popularidade. Calígula distribuiu riquezas entre soldados, chefes de família e livrou os senadores do fantasma dos julgamentos por traição. Ao povo, chegou a distribuir moedas em praça pública.

Pão e circo

Além desses agrados, Calígula investiu nos jogos. Ele adorava as lutas de gladiadores, e para tornar o espetáculo ainda mais emocionante (dependendo do ponto de vista, é claro) instituiu a luta desigual, em que um dos gladiadores entrava na arena com algumas desvantagens. Lembra das lutas desiguais do filme Gladiador?

Além das lutas, Calígula investiu nas corridas de bigas, que aconteciam no estádio chamado Circo Máximo. As corridas de bigas eram velozes e bem perigosas, tanto para as pessoas quanto para os cavalos. Bem ao gosto do imperador.

Calígula também incentivou as artes dramáticas, das quais ele fã. Todo esse "pão e circo" dos primeiros meses inflou a popularidade do jovem imperador.

Circo Máximo
As corridas de bigas aconteciam no Circo Máximo (à esquerda), que tinha capacidade para 250 mil pessoas.

Violência: uma marca de Calígula

Certa vez, Calígula adoeceu gravemente. Ao que tudo indica, foi nesse momento que a "chavinha virou". Quando se recuperou, mandou matar Gêmelo, neto de Tibério e sucessor legítimo ao trono. Forçou Macro ao suicídio. Tudo isso por supor que ambos haviam preparado o terreno para a sucessão enquanto ele estava enfermo.

Segundo historiadores, a paranoia e a violência foram marcas do governo de Calígula. À menor desconfiança, ele mandava matar. E as maiores vítimas dessa ferocidade sanguinária foram os senadores.

Calígula X Senado

Nenhum tirano gosta que venham lhe moderar o poder. Tiranos governam sozinhos e fazem o que querem quando bem entenderem. E Calígula era assim. Daí a sua perseguição implacável aos senadores, que incluiu campanhas difamatórias, insultos públicos, condenações por traição e até assassinatos.

O cavalo de Calígula foi nomeado cônsul?

Um dos episódios mais comentados da perseguição aos senadores foi a suposta nomeação de Incitatus, o cavalo puro-sangue predileto de Calígula, ao ambicionado cargo de cônsul. Segundo o historiador Suetônio, Calígula teria cogitado nomear seu cavalo cônsul diante de senadores perplexos. Mas, diferentemente do que alguns dizem, essa nomeação de fato nunca ocorreu.

Festas e orgias sem fim

Uma das coisas que os senadores não aprovavam na conduta do imperador era a gastança desenfreada com festas e banquetes. Claro que isso não era exclusividade de Calígula. O palácio do ex-imperador Tibério na ilha de Capri já era um antro de devassidão. Mas sob o governo de Calígula a coisa ganhou proporções gigantescas.

Excessos do imperador: megalomania e frivolidade

O imperador era um homem cheio de caprichos. Um deles foi a construção de duas enormes barcaças no lago Nemi, localizado ao sul de Roma. Esses dois navios mediam o equivalente a dois campos de futebol. Um deles era ricamente ornamentado e servia para Calígula promover suas festas. O outro era um templo destinado à deusa Diana. Os barcos foram descobertos no fundo do lago na década de 1930.

lago nemi
O lago Nemi fica 30 km ao sul de Roma.

Outra extravagância bem conhecida foi a construção de uma ponte flutuante de 5 km entre os portos de Puzzuoli e Baias. Para isso, foi ordenado o afundamento de navios e o uso de pedras. Sobre a ponte foi encenada uma peça de teatro.

Conspiração fracassada contra Calígula

O gênio tirano de Calígula encontrou muita resistência, inclusive de seus familiares. Houve uma conspiração contra Calígula que envolveu aristocratas, suas duas irmãs e Lépido, seu cunhado. Lépido era casado com a falecida Drusila, irmã com quem supostamente Calígula tinha um caso.

drusila
Busto de Drusila, Após sua morte, declarada deusa após sua morte pelo imperador. Museu Glyptothek, em Munique.

Quando Calígula descobriu a conspiração, mandou matar Lépido e enviou as duas irmãs para o exílio na mesma ilha onde sua mãe havia morrido. Aristocratas foram presos e torturados até a morte. Era a forma como Calígula reagia quando se sentia ameaçado.

Um imperador que se considerava um deus

Tiranos costumam ter egos gigantescos. Acredita que Calígula chegou a se autoproclamar deus vivo? Isso era algo completamente incomum e chocante na Roma Antiga, onde só os imperadores mortos ascendiam à condição divina. Construiu mais de um templo e tentou instituir um culto a si mesmo. Mandou construir uma estátua sua de ouro, cujas vestimentas eram trocadas diariamente conforme a vestimenta que o imperador estava usando.

Transferência da capital para Alexandria

No final do ano 40 d.C. Calígula quis transferir a capital do Império e toda a corte de Roma para Alexandria, no Egito. A intenção por trás disso era se afastar definitivamente do Senado. Na verdade, essa medida não agradou a ninguém, muito menos aos guardas pretorianos, que perderiam poder.

O assassinato de Calígula

Ninguém consegue governar pelo medo durante muito tempo. E com Calígula não foi diferente. Muita gente estava cansada dos caprichos e crueldades do imperador. Até hoje há quem pense que Calígula era louco. Será?

O fato é que Calígula foi se isolando. Nem o povo, que a princípio havia apreciado as humilhações impostas a senadores e aristocratas, parecia estar ao lado de seu imperador.

morte de Calígula
A Roman Emperor (1871), de Lawrence Alma-Tadema, mostra Calígula morto e o novo imperador atrás das cortinas.

A conspiração fatal envolveu senadores e sobretudo guardas pretorianos, liderados por Cássio Quereia. Além dos motivos já mencionados, motivava Quereia o fato de ser humilhado constantemente por Calígula.

A ocasião foram os Jogos Palatinos de 41 d.C., evento festivo em homenagem ao imperador Augusto. No último dia dos jogos, enquanto Calígula retornava ao palácio, foi surpreendido por Quereia no meio de uma galeria subterrânea (criptopórtico). Quereia o atingiu uma vez com um golpe de espada. Ferido, Calígula ainda tentou escapar, mas foi surpreendido por outros conspiradores, que o apunhalaram várias vezes.

Quem sucedeu Calígula?

Após o assassinato do imperador, guardas pretorianos invadiram o palácio e mataram a esposa, Milônia Sesônia, e a filha de Calígula. A ideia era não deixar qualquer sucessor. Só poupam Cláudio, tio de Calígula.

No Senado, discutia-se quem seria o novo imperador. Alguns até pensavam na possibilidade de restabelecer o regime republicano. Mas os pretorianos, avessos à ideia de República, regime que lhes tiraria poder, impuseram o nome de Claúdio como novo imperador.

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