Dia da Sobrecarga da Terra: o que é e como podemos revertê-lo


Estamos ficando em débito com o planeta cada vez mais rápido. E este não é um recorde para comemorar: todos os anos, diminui o número de dias em que estamos equilibrados em relação ao uso dos recursos naturais disponíveis no planeta. Mas como isso é calculado e o que pode ser feito para evoluirmos a uma humanidade mais sustentável? Vejamos.

Como a sobrecarga da Terra é medida?

Pegada ecológica e biocapacidade

Resumidamente, a sobrecarga é medida por uma conta de subtração que leva em consideração dois números. De um lado, a chamada pegada ecológica - que mede a demanda da população por recursos naturais. De outro, a capacidade ecológica ou biocapacidade do planeta - ou seja, a sua capacidade de renovação.

Os nomes são complicados, mas a conta até que é fácil de entender. Se a pegada ecológica for maior que a biocapacidade, estamos em déficit. Nesse caso, o consumo de recursos naturais é maior do que a capacidade de renovação da Terra. E o contrário também é verdadeiro: se a biocapacidade é maior que a pegada, o saldo é positivo. Fosse assim, seríamos credores.

Mas a má notícia é que, em termos globais, estamos em débito há algum tempo.

Terra

O que é o Dia de Sobrecarga da Terra?

Esse cálculo da sobrecarga da Terra é feito anualmente desde 1970. Isso quer dizer que todos os anos, de acordo com o consumo, é possível determinar o dia em que o uso de recursos no ano supera a capacidade de regeneração da Terra neste mesmo ano.

Em 2019, quando a humanidade conseguiu bater seu recorde negativo, o Dia de Sobrecarga da Terra caiu em 29 de julho, pior marca desde o início da série histórica. De acordo com esses dados, para garantir nosso padrão de consumo atual, um planeta é pouco: seria necessária 1,75 Terra para dar conta da demanda atual! Haja Terra, não é mesmo?

Isso significa que, deste dia em diante, ficamos em débito, já que o planeta não será capaz de repor até o final do ano tudo aquilo que consumimos até agora. Se a tendência negativa se confirmar, o Dia de Sobrecarga da Terra acontecerá cada vez mais cedo, o que quer dizer que a Terra precisará de cada vez mais tempo para renovar seu estoque de recursos naturais.

Quem criou esse conceito de dívida ecológica é o ambientalista Andrew Simms. O cálculo do Dia de Sobrecarga da Terra é feito anualmente pela think tank Global Footprint Network. Uma think tank é uma organização não governamental voltada à pesquisa e que tem por objetivo, além de difundir o conhecimento, fazer recomendações para as autoridades políticas.

Neste caso, a causa envolvida é o meio ambiente. E a Global Footprint Network, além de fornecer dados valiosos que nos permitem saber como o nosso estilo de vida afeta o planeta, também dá dicas importantes sobre como podemos reverter esse jogo. Afinal, nem tudo está perdido. Ainda.

O que fazer para reverter esse quadro?

Meio ambiente

A Global Footprint Network, em parceria com a New Economics Foundation, de Andrew Simms, criou em 2006 a campanha Dia de Sobrecarga da Terra, cujo objetivo é inverter a tendência de consumo não sustentável e alterar a data de sobrecarga do planeta a cada ano.

Só para se ter uma ideia, em 1970, quando o cálculo começou a ser feito, o dia de sobrecarga era 29 de dezembro. E a data veio caindo a cada ano: em 1980, foi 4 de novembro; dez anos depois, 11 de outubro; em 2000, 23 de setembro; em 2010, 7 de agosto. Em 2019, como já vimos, 29 de julho. A tendência, se mantivermos o ritmo crescente de consumo, é a de que esse dia-limite ocorra cada ano mais cedo.

O Move the Date (ou Mova a Data) tornou-se o símbolo de uma atitude de superação. E o incentivo é que todos se tornem Date Movers - ou seja, Alteradores da Data. Afinal, as soluções para os problemas ambientais passam pelo esforço conjunto da população mundial. Por isso, é importante que saibamos exatamente aquilo que cada de um nós pode fazer para ajudar a mover a data no próximo ano e fazer com que o planeta precise de cada vez menos tempo para repor tudo aquilo que usamos da natureza.

Claro que não é fácil reverter esse quadro. Diminuir a devastação do ambiente implica mudarmos nosso próprio estilo de vida. Governos têm que tomar atitudes, por meio da formulação de políticas públicas, mas todos nós, incluindo as empresas, devemos rever determinados hábitos para que se possa construir um futuro melhor.

De acordo com a Global Footprint Network, as soluções passam necessariamente por 5 áreas de atuação:

  1. cidades;
  2. energia;
  3. comida;
  4. planeta;
  5. população.

1. Cidades

Cidade

Uma coisa deve estar clara desde sempre: essa batalha é, antes de mais nada, urbana. Até 2030, estima-se que 60% da população mundial viva em cidades. Esse número vai subir para 80% em 2050. Sem planejamento urbano inteligente e sustentável, será impossível revertermos o cenário de degradação.

Uma cidade sustentável é aquela em que sua biocapacidade excede a pegada ecológica. Mas como fazer isso? Entre outras coisas, investir em reciclagem, preservar e a ampliar as áreas verdes, reduzir a poluição e substituir o transporte individual motorizado pelo coletivo.

Este último ponto é realmente importante, já que 60% da nossa pegada ecológica tem a ver com a emissão de carbono na atmosfera. Desse valor, o transporte individual representa 17%. Se todo o mundo reduzisse em 50% o uso de carros e motos, moveríamos a data em 11,5 dias.

2. Energia

Poluição do ar

Nesse campo, o lema é um só: apostar em energias limpas! Em outras palavras: produzir uma descarbonização da economia. Reduzir a emissão de gases poluentes na atmosfera significa, além do enfrentamento às mudanças climáticas, diminuir consideravelmente a nossa pegada ecológica - ou seja, a nossa demanda por recursos.

Se as mudanças na área energética forem consideráveis, os ganhos serão imensos. Uma redução de 50% da participação do carbono na pegada ecológica mundial representaria um movimento de 3 meses do Dia de Sobrecarga do Planeta!

Por isso que o cumprimento das metas estipuladas pelo Acordo de Paris é tão importante. Trata-se de uma convenção internacional que prevê a redução da emissão de gases do efeito estufa (entre os quais aqueles que saem de chaminés e de escapamentos de veículos) com a finalidade de conter o aquecimento global.

3. Comida

Carne supermercado

Quando o assunto é sustentabilidade, a forma como nos alimentamos é fundamental. A nossa demanda por alimentos é responsável por nada mais, nada menos que 26% da pegada ecológica global.

A Global Footprint Network chama atenção para dois aspectos da nossa alimentação: o elevado consumo de carne e o desperdício.

A produção de carne exige vastas áreas para pastagem, muita água e ainda por cima gera grandes quantidades de gases de efeito estufa (aproximadamente 15% do total emitido na atmosfera). A opção por vegetais, além de ser saudável, é ótima para o meio ambiente. Estima-se que uma redução de 50% do consumo de carnes produziria um ganho de 15 dias no cálculo da sobrecarga da Terra.

Quanto ao desperdício, cerca de 1/3 de todo alimento produzido vai literalmente para o lixo, o que significa 1,3 bilhão de toneladas todos os anos. Nesse quesito, os EUA nadam de braçada: 40% do alimento produzido nesse país é desperdiçado, seja na produção, no transporte ou no seu destino.

4. Planeta

Desmatamento

Já plantou uma árvore? Esse é um bom começo para salvar o planeta. E se todo mundo fizesse isso, os ganhos seriam ainda maiores. Reflorestar 350 milhões de hectares movimentaria em 8 dias a data-limite de sobrecarga da Terra.

Por isso é preocupante saber que florestas, as poucas que ainda temos, continuam sendo devastadas. Dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) dão conta de que em junho de 2019 o desmatamento da Amazônia aumentou 88% em relação ao mesmo mês do ano anterior.

Um planeta sustentável deve seguir um caminho contrário ao da destruição de florestas. O reflorestamento e a pesca sustentável são duas medidas cruciais caso queiramos que a Terra nos suporte pelas próximas gerações.

5. População

População multidão

Somos muitos: mais de 7 bilhões, e a perspectiva é a de que nos próximos anos seremos ainda mais. Isso nos coloca uma questão óbvia: se os recursos são finitos e há cada vez mais pessoas consumindo esses recursos, o que fazer para fechar a conta?

A primeira coisa que devemos pensar é que o padrão de consumo não é o mesmo em todos os lugares do mundo. Só para se ter uma ideia dessa desigualdade, a pegada ecológica média de um cidadão norte-americano é quase 4 vezes maior do que a de um brasileiro. Isso significa que um norte-americano, segundo os padrões atuais de consumo, necessita de uma área (em hectares globais) 4 vezes maior do que área exigida por um brasileiro.

Assim, a questão populacional em si não é um problema, se pensarmos que existe uma desigualdade no acesso a recursos. É preciso, antes de mais nada, que países com uma maior pegada ecológica reduzam esse consumo excessivo. A Terra entraria em colapso imediato caso todo o mundo seguisse o padrão norte-americano.

Além disso, a Global Footprint Network defende que um empoderamento das mulheres, com igualdade de direitos, de acesso às oportunidades profissionais e à educação, contribui com a redução das taxas de fertilidade. Em outras palavras: igualdade de gênero significa taxas reprodutivas menores.

Planejamento familiar e acesso fácil e gratuito a contraceptivos também são fatores importantes para evitar uma Terra ainda mais superpopulosa no futuro. A ONU espera uma população de quase 10 milhões em 2050, quando quase toda a população mundial viverá em cidades. Caso cada família tenha um filho a menos, até 2050 o dia-limite de sobrecarga do planeta seria alterado em 30 dias.

Coisas práticas que você pode fazer para mudar o destino do planeta a partir de hoje

Sustentabilidade

  1. Torne-se um modificador de dias (Date Mover), buscando informações e trocando ideias com outras pessoas ao redor do mundo que têm essa mesma pegada ecológica. Como fazer isso? Entre no site da Global Footprint Network, conheça a campanha e participe do movimento. A nossa e as próximas gerações agradecem!
  2. Reforce a dieta em vegetais. Vimos como o excessivo consumo de carne, além de não fazer bem para o nosso organismo, gera efeitos devastadores no meio ambiente. Por isso, comer menos carne e mais vegetais é uma ação bastante positiva na construção de um mundo sustentável.
  3. Não use ou use menos transportes individuais. Se o carbono é o maior vilão de toda essa história, que tal trocar seu carro ou sua moto pelo transporte coletivo? Bikes e caminhadas também são super bem-vindas!
  4. Assine petições e abaixo-assinados. Há muitas organizações que lutam pela preservação do meio ambiente e precisam do seu apoio para alcançar vitórias.
  5. Mergulhe em dados confiáveis. Estar bem-informado é fundamental para revertermos esse cenário. Você sabe qual é a sua pegada ecológica? Sabe quantos planetas seriam necessários caso todas as pessoas do mundo consumissem recursos como você? E seu país: tem reserva ou déficit de biocapacidade? Todas essas informações você pode encontrar na página da Global Footprint Network.
  6. Simplifique seu guarda-roupa. Nosso vestuário é responsável por 3% da pegada ecológica global. Reduzir o consumo e doar roupas são ações que podem ajudar.
  7. Viaje com sustentabilidade. Além dos cuidados básicos com o lixo, o site recomenda buscar hotéis com fonte de energia renovável, optar pelo transporte coletivo em vez de alugar um carro e incentivar a produção local de produtos orgânicos. Não é porque você não está na sua cidade ou no seu país que deve deixar de se preocupar com o meio ambiente. A Terra é uma só!
  8. Evite desperdício de comida. 9% da pegada ecológica global vem do desperdício de alimentos. Portanto, vamos ficar atentos a isso!
  9. Ajude a melhorar o meio ambiente, plantando árvores, reciclando o lixo, cultivando jardins sustentáveis. Mas essas não são as únicas formas de ajudar. O que você pode fazer pelo meio ambiente?
  10. Desafie líderes políticos. As principais decisões são tomadas a portas fechadas. Tudo o que pudermos fazer do lado de fora é extremamente válido. Identifique os problemas da sua cidade. Encontre uma forma de entrar em contato com deputados, vereadores, secretários. Faça com que sua opinião seja ouvida. Afinal, é o destino do nosso planeta que está em jogo.

Leia também: 7 animais brasileiros que podem entrar em extinção

Veja as últimas previsões e teorias de Stephen Hawking